quinta-feira, janeiro 25, 2007

O quarto

Uma luz, o que via mais? Assim o quarto onde estava. As paredes. O teto e o chão. Sem portas e janelas. As paredes, brancas, o teto e o chão, pretos. Ou o contrário, não se podia afirmar. Certo é que não havia saída. Vozes, sim, vozes. Decerto sabiam de tudo. Não de tudo o que havia feito, de tudo o que se passava. Seu segredo ainda era um segredo. Talvez desconfiassem de algo. A tortura. Sim, haverá. A menos que...impossível. Mas e se...não, não poderia. E pensava. Como teria entrado? Então haveria uma saída. Mas e se uma das paredes tivesse sido feita depois? Não estaria pintada por dentro. Seria possível? Nada fazia sentido. A luz acesa. Não a alcançava. Percebeu que não havia saído do lugar, apenas analisara a situação. As paredes, pretas, o teto e o chão, brancos. Sim. Andou. Paredes? Se houvesse estavam em outro lugar. O lugar, bem maior. Muito maior. Todo preto, menos o que se entendia como teto e chão, que agora se entendia, apenas dois quadrados pintados. Quanto mais se afastava menos os via. Algo no chão. Uma alavanca. E a luz se apagou. Outra acendeu. Bem acima de si. Dois novos quadrados. Brancos. A alavanca travada. Caminhou ainda mais. Sempre uma nova alavanca, sempre uma nova luz. Uma única luz. Por mais que andasse e fizesse estratégias, uma nova alavanca só aparecia quando não se via mais os quadrados, brancos. E sempre acendia uma nova e única luz, acima de si. Onde estava afinal? Existia afinal? Vozes, sim, vozes. As mesmas vozes da consciência, ou da inconsciência. Estaria drogada? Sonhar não sonhava. Sua roupa. Finalmente notara sua roupa. E o ponto de partida? Não havia alavanca. Nunca mais encontraria. Nem fazendo cálculos matemáticos. Já não se lembrava que caminho havia percorrido, quantas alavancas havia trancado. A roupa. Calça e camisa pretas, totalmente. Nada mais. Pensar, pensar e...pensar. Tirou a roupa. Ao avesso eram brancas. As roupas eram brancas ao avesso. Não totalmente. Havia um...mapa. Sim, um mapa. Lá estava o ponto de partida. Lá estava a saída. Bem ao lado. A partida estava entre duas alavancas, uma delas, a saída. Onde estaria agora? Por que não escolheu o outro lado? Nunca saberia, pois sabia onde estava. Se tivesse invertido a roupa logo no começo. O mapa também indicava o fim, não só a saída. Quando a luz começasse a piscar é porque a penúltima alavanca havia sido puxada. E a luz piscou? Piscou. E ela apagaria. Apagou. Agora, qualquer alavanca puxada será a última. Todas as que restam trancam a única que leva à saída. E a única que leva à saída está em algum lugar, no escuro. Vozes, sim, vozes.

1 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Eu não sabia ser quem eu era, sem encontrar o limite mais profundo de uma agulha, me feria vermelhamente.
Eu não sabia ser quem eu era, pousei a agulha sobre meus seios, fiz deles minhas mãos. Do objeto, cada ponta equilibrava-se nos pedaços daqueles enchaços de pele, que então se comunicavam. Quando solucei, o limite mais fino me invadiu, me feri vermelhamente.
Eu não sabia ser quem eu era, verticalmente e sem respirar, coloquei a agulha em meu umbigo. Segundo ilusórios, ela quedou para formar 30 graus com a superfície de pele mais próxima, minha barriga. Então insisti, um de meus dedos a manteve de pé, era outra passarela, agora forjada, mas sangrei verdadeiramente, me feri.
Eu não sabia ser quem eu era e ela deslizou com seu próprio peso por toda a minha perna esquerda. Não sei quem escorregava mais depressa, se ela ou meu vermelho escuro. Sei que pinguei e a agulha se banhou em gotas disformes.
Minha mão direita, no chão, sentia o líquido morno quando a encontrou, estava ainda toda prateada... Me feri vermelhamente sem saber quem eu era.
Eu não sabia ser quem eu era, com o corpo perfurado a encostei em minha pálpebra esquerda, a minha pele mais fina a sustentou, por instantes. Não me feri. Tudo estava seco e, estéril, eu quase desfaleci.

Abruptamente enfiei a agulha dentro de meu olho esquerdo para depois fazer o mesmo com o direito. Me feri vermelha e cegamente. Então eu sabia ser quem eu era.
E não vi mais o objeto, tão pouco pude constatar o meu sangue com a minha visão. Me feri vermelhamente enquanto descobria ser quem eu era: toda vontade de dor, cega.

(eu)Era e me criava em vermelha dor vertida.

Guilherme, conheci sua irmã no carnaval e ela me contou do seu blog. Gostei muito dele.
"O quarto", que adorei, me fez escrever este outro texto, não sei o pq.
Um beijo,
Julia

11:09 PM  

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